domingo, novembro 26

O tempo

Hoje li o jornal e soube que o Mário Cesariny tinha morrido e comecei a pensar sobre a minha vida aqui em Genebra. Sempre pensei que sendo bolseira ia ter tempo para fazer imensa coisa porque este ano não seria preciso trabalhar e esse tempo ia ser canalizado para outras coisas. Afinal, não, continuo sem tempo e apercebi-me que desde a minha chegada nem sequer entrei num livraria aqui, nem sequer li um livro por prazer e quando compro uma revista acabo por lê-la desactualizada. Eu até acho que não tenho desperdiçado o tempo. Tenho trabalhado imenso para o Instituto, tenho tido reuniões por causa da associação de estudantes, tenho saído com os amigos, mas não tenho tido aquele tempo especial para mim, aquele tempo que é tempo de não fazer nada, aquele tempo que é tempo de deambular e pensar, aquele tempo de sentar na esplanada e só olhar. Parece que nunca tenho tempo e que nunca o tive. Nem aqui, nem noutro sítio qualquer... E pior é o saber-se que o tempo acaba, um dia. Aqui fica o meu poema favorito do Mario Cesariny, sobre o tempo e o seu fim:

Do capítulo da devolução

Hoje venho dizer-te que morreste e que velo o teu corpo
no meu leito, um corpo estranho e surdo um
corpo incompreensível

aquele desespero que deixou de ter forças para erguer
os portais do outro reino tristeza de menino a
quem tiraram tudo, até a tinta e as flores e o prazer
de gritar

esse (foi visto) deve subsistir porque é a tua maneira de
tomar banho no cosmos, olhor o cosmos como os
que ainda podem interrogar as ondas e morrer

mas tu ainda não sabes a que ponto morreste; vais até
à janela, aspiras com cuidado o oxigénio que o
espaço te oferece, apontas rindo a meiga criatura
que pela rua arrasta a sua condição de animal
fulminado

depois olhas para mim, olhas as tuas mãos, e elas
ambas, tão claras, tão seguras, são as mãos de
um soldado a arder em febre, aves a percorrer o
seu novo deserto

mas tu sabes, tu viste, e mais do que eu; a mão do
homem é doce e iluminada como a noite como
um rasto de fumo sobre os hospitais

tivemos uma história mas a história foi-se, em fileiras
angélicas e gratas, a fazer a manhã de outras
paragens; outra sombra, outros olhos semelhantes

noutro leito nas nuvens deito os teus cabelos, o teu
cansaço e a minha miséria, os teus braços e os
meus, altos como cidades, altos como flores

parou o automóvel, lá em baixo, e eu não tenho mais
que descer as escadas, fechar ainda a porta do
teu quarto, atravessar de um pulo a minha própria
vida

agora posso sonhar até deixar de te ver

belo rio sem lágrimas

9 Comentários:

Blogger Eu disse...

que nostalgia... vê se tiras umas meias horas só para ti..para deambular. tira o pé do acelerador miuda...

11/26/2006 4:34 da tarde

 
Blogger Sandra Malandra disse...

Vou tentar, miudo...

11/26/2006 4:38 da tarde

 
Anonymous Anónimo disse...

Pues es impresionante, pero si entiendo el portugués escrito y un poquito hablado... Es curioso porque justo después de tu elección como presidente te vi la cara de felicidad y nerviosismo al mismo tiempo. Todo saldrá bien, recuerda que lo que importa es el equipo, en política como en la vida, la base es el equipo, sin equipo no eres nadie, ni nada...
Por supuesto el que escribe este comentario es el que tiene aire de Indio, es curioso, nunca lo había visto de esa manera, pero sabes me gusta venir de donde vengo y sentir mis raíces... Espero que esto te pueda poner feliz...y recuerda que lo importante es sonreir...

11/27/2006 12:02 da manhã

 
Blogger Sandra Malandra disse...

Je vais pas écrire en espagnol, ça te ferai trop rire:) Merci pour ton soutient, Ivan. Tu sais, il y a beaucoup de choses qui se mélangent en ce moment, ce n'est pas à cause de la présidence, c'est un mélange de sentiments... Quant au comité, je sais que nous sommes une très bonne équipe, j'ai pu le voir hier et j'ai plein de confiance en toi, sous tous les aspects. Je suis sure que nos racines feront la différence:) Me gustas mucho, chico (je sais qu'on ne dit pas "chico", mais je sais pas dire autrement!)

Besos

11/27/2006 11:42 da manhã

 
Anonymous Anónimo disse...

quem é o gato com a t-shirt branca?

12/05/2006 1:32 da tarde

 
Blogger Sandra Malandra disse...

Acho que te enganaste no post. Mas deves ser TU:)!!!

Não me esqueci do nosso reencontro em Carcavelos... Do nome da tua terra é que já não me lembro...Arneiro!?

Beijitos e saudades de uma noite portuguesa bem regada e com fado:)))

12/06/2006 2:04 da tarde

 
Anonymous Anónimo disse...

saudades dessas mesmas noites bem regadas e com fado.
beijos e tambem nao me esqueci da volta por ai (suiça) que me foi prometida...

12/07/2006 2:50 da tarde

 
Blogger Sandra Malandra disse...

Eu teria cumprido se tu tivesses acordado cedo e vindo bater à minha porta. Mas podes sempre voltar, os voos estão ainda mais baratos;)

beijitos saudosos. Podemos tentar passear por Lisboa nas férias do Natal. Eu vou acordar para isso, pelo menos!!

:)

12/07/2006 7:22 da tarde

 
Blogger Sandra Malandra disse...

Só uma pergunta:
Tex = Tininho...???

Sei que é imperdoável, mas são os efeitos dos shots que me fizeram beber à força....

Agora sendo séria, foi bom "ser portuguesa" nesta noite...

As vezes, coisas pequenas fazem-nos pensar...

Beijinhos grandes

12/07/2006 8:44 da tarde

 

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